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O processo seletivo perfeito (ou quase) para pessoas desenvolvedoras de software
O processo seletivo efetivo é algo extremamente importante para conquistarmos os grandes talentos do mercado de trabalho ou identificar pessoas que podemos ajudar a se desenvolver. Esse post é o resultado da pesquisa sobre 'o processo seletivo perfeito (ou quase) para pessoas desenvolvedoras de software'
O processo seletivo para contratação de pessoas desenvolvedoras de software é algo extremamente complicado, pois existem milhares de opiniões do que deve ser feito e o que não deve ser feito baseado em nossas experiências pessoais. Porém, às vezes, o que é legal para a gente não é legal para a grande maioria e isso complica a prospecção de novas pessoas para a nossa equipe ou equipes.
Algo que às empresas esquecem é que o processo de seleção vai falar muito sobre como é a empresa. Como é sua gestão, como são as pessoas que trabalham lá, cultura, etc. E isso tudo faz parte do trabalho para gerar engajamento do funcionário (Employee Engagement).
Employee Engagement é um conceito fundamental no esforço de entender e descrever, qualitativa e quantitativamente, a natureza do relacionamento entre uma organização e seus funcionários . Um “funcionário engajado” é definido como aquele que é totalmente absorvido por e entusiasmado com seu trabalho e por isso toma medidas positivas para promover a organização de reputação e os interesses. fonte: Wikipedia
Visando facilitar a escolha do que fazer ou não fazer em um processo seletivo para pessoas desenvolvedoras de software, puxei uma pesquisa nas comunidades de programação para saber a opinião das pessoas quanto ao que gostam e não gostam em uma entrevista/processo.
Conseguimos 753 respostas, onde 75.7% pessoas do gênero masculino, 22.4% feminino e 1.9% preferiu não dizer. 88.7% são pessoas brancas, 99.2% são pessoas cis e 97.6% não é PCD.
Dessas pessoas, temos os seguintes níveis profissionais:
nível profissional | representatividade |
---|---|
estagiário | 11.5% |
junior | 26.3% |
pleno | 31.9% |
sênior | 21.7% |
especialista | 8.7% |
Uma grande parcela possui graduação completa:
graduação | representatividade |
---|---|
completa | 54.6% |
incompleta | 33.6% |
não possui | 11.8% |
Vamos conferir as respostas!
Sobre a entrevista de emprego
Qual o tempo ideal para uma entrevista na empresa?
A grande maioria prefere ficar no máximo 1 hora na sala fazendo a entrevista.
tempo ideal | representatividade |
---|---|
no máximo 1 hora | 57.2% |
30 minutos | 29.1% |
menos de 30 minutos | 7.8% |
mais de 1 hora | 5.8% |
Lembrando que nessa pergunta não sabemos exatamente o que as pessoas gostariam de responder ou fazer no tempo em que está na sala.
Você gosta de fazer teste prático na hora da entrevista?
Teste prático na hora da entrevista são aqueles que temos que fazer em uma hora, dentro da sala, com alguém observando ou não.
A grande maioria não gosta disso trazendo uma representatividade de 62.9% que não gosta de resolver testes práticos na hora da entrevista e 37.1% que gosta ou não se importa com isso.
Muito fácil de entender isso, visto que programação é um trabalho criativo e a ansiedade de um processo seletivo somado a pressão de resolver algo em pouco tempo bloqueia totalmente nossas ideias.
Você acha legal fazer testes de algoritmos em papel ou quadro branco pessoalmente na hora da entrevista?
Essa é uma questão que pega para a maioria das pessoas desenvolvedoras de software em processos seletivos. O teste do quadro branco é/era utilizado em várias empresas grandes e outras copiaram o processo, mas isso acaba inibindo pessoas ansiosas.
Existe até um repositório com mais de 9 mil curtidas (estrelas) que lista empresas que não possuem essa prática: Hiring Without Whiteboards.
O engraçado é que no repositório temos o criador do Ruby on Rails, DHH, com a seguinte frase:
Olá, meu nome é David. Eu falharia em escrever um bubble sort em um quadro branco. Eu olho código na internet o tempo todo. Eu não faço enigmas.
Hello, my name is David. I would fail to write bubble sort on a whiteboard. I look code up on the internet all the time. I don't do riddles.
— DHH (@dhh) February 21, 2017
Isso é algo que comprova que pessoas fantásticas são perdidas em processos seletivos por causa dessa prática.
Na pesquisa, 79.4% não acha legal escrever algoritmos em quadro branco/papel na hora da entrevista e somente 20.6% gosta ou não liga.
Algo que me surpreendeu muito foi o fato de que as pessoas com graduação completa ou incompleta também não querem fazer o teste do quadro branco. Onde, somente 113 pessoas acham legal ou não ligam, das 571 que tiveram acesso a academia.
Você se sente confortável tendo mais de 2 pessoas dentro da sala te entrevistando?
Algumas pessoas dizem que não gostam da sala cheia de pessoas na hora da entrevista. Eu entendo o lado dessa galera. Às vezes parece que estamos em uma sabatina e uma hora nem sabemos mais quem ali está querendo nos entrevistar ou quem só está fazendo pergunta aleatória pra encher linguiça, como “qual animal você seria?” ou “o que você faria se acontece um apocalipse zumbi?”.
Mas os números mostram que as pessoas não ligam tanto assim para a quantidade de pessoas que tem na sala durante a entrevista, onde 70.8% das pessoas se sente confortável tendo mais de 2 pessoas entrevistando e 29.2% não se sente bem.
Você gosta de responder perguntas técnicas na hora da entrevista?
Essa questão é bem simplória, pois sabemos que a maioria das pessoas esperam esse tipo de contato na entrevista presencial. Esperamos que sejamos questionados (as) sobre o que conhecemos e o que já fizemos nas experiências e projetos em que atuamos.
81.9 diz que gosta de responder perguntas técnicas na hora da entrevista e somente 18.1% diz que não, provavelmente pela questão da ansiedade e pressão de estar em um processo seletivo e aquela velha síndrome do impostor.
Você gosta de dinâmicas antes de começar a entrevista propriamente dita?
É um estereótipo da pessoa desenvolvedora que ela não gosta muito de dinâmicas, que são pessoas mais introvertidas e, no caso da pesquisa, o resultado mostra que isso tem seu sentido.
69.3% não gosta de dinâmicas na entrevista e somente 39.7% gosta ou não liga.
Isso é engraçado, pois acaba confirmando que estamos tão ansiosos com o processo que queremos chegar lá, responder um monte de pergunta e saber logo o resultado.
Sobre o teste prático
Você gosta de receber o teste prático para fazer em casa?
Nós gostamos de fazer o teste prático com calma e atenção aos detalhes, para entregar algo que demonstre realmente o que nós dominamos.
As pessoas podem alegar que fazer o teste prático presencialmente mostra como o entrevistado ou entrevistada se comportaria sobre pressão, mas a pressão do dia-a-dia no trabalho nem se compara com a pressão de estar em um processo seletivo.
A vida da pessoa pode estar sendo decidida no processo e é muito mais difícil do que só receber um um feedback negativo por estar demorando a entregar.
86.7% gosta de receber os testes práticos para fazer em casa, somente 7.4% não gosta de fazer o teste em casa e 5.8% nem gosta de fazer testes práticos.
Lembrando que quando falamos de fazer um teste prático, não significa que você, pessoa recrutadora, deve mandar um freela para a pessoa entrevistada. O que acontece em diversas empresas hoje em dia, que mandam um requisito enorme para ser desenvolvido em alguns dias.
Lembrem-se que, além do processo para a sua empresa, a pessoa pode estar participando de outros processos assim como pode estar empregada e não ter tanto tempo disponível assim para resolver todas as suas exigências, fazendo assim que você perca talentos por um processo seletivo falho, não por falta de pessoas capacitadas para suas posições de trabalho.
Quanto é o tempo ideal para se fazer o teste prático em casa?
A maioria das pessoas, provavelmente pelos pontos que citei acima, preferem 1 semana de prazo para entrega do teste prático (já imaginando que ele será com uma lista de requisitos bem extensa, que é o que estamos acostumados (as)), onde:
tempo de entrega | representatividade |
---|---|
poucos dias (1 à 3) | 34.3% |
1 semana | 42.6% |
2 semanas | 8.5% |
3 semanas | 1.2% |
1 mês | 1.1% |
sem prazo definido | 12.4% |
Você prefere um teste prático que seja uma funcionalidade inteira (como um CRUD ou uma tela com muitas interações) ou um teste mais rápido e menos parecido com o mundo real?
A maioria das pessoas prefere fazer um teste rápido, mas ainda parecido com o mundo real, mostrando que as pessoas querem fazer um teste que não tome muito do seu tempo, mas mostre que elas realmente sabem o que fazem.
Muitas vezes ouvimos de gestores que as pessoas querem testes fáceis para passar logo na entrevista e depois acabam sendo pessoas improdutivas, acho que essa resposta acaba invalidando essa premissa.
resposta | representatividade |
---|---|
uma funcionalidade inteira, mas não tão grande | 29.2% |
uma funcionalidade inteira e totalmente igual o mundo real da empresa | 8.4% |
um teste mais rápido, mas ainda parecido com o mundo real | 52.9% |
um teste mais rápido, mas indiferente ao mundo real | 9.6% |
Você acha que o teste prático deve refletir exatamente o que você fará no dia-a-dia na empresa ou pode ser mais generalista?
As pessoas realmente só querem fazer algo que demonstre seu conhecimento técnico sem abusos por parte da empresa. Visto que as respostas aqui ficaram muito balanceadas: 57.4% acham que o teste pode ser generalista, como um teste de lógica de programação e 42.6% acreditam que o teste deve refletir exatamente o que elas vão fazer no dia-a-dia.
Finalizando
Em quantos dias você acha que a empresa deveria te responder se você passou ou não?
Essa pergunta foi extremamente previsível, pois uma grande parte das empresas não dá feedback sobre o seu processo seletivo, como em qual parte do processo nós estamos ou um prazo de em quanto tempo irá nos responder e as pessoas tem pressa.
O pior, algumas empresas nunca respondem quem não passou. Às pessoas fazem todo o processo, passam por todas as etapas e nunca recebem a resposta do porque não passaram e quando recebem é uma resposta tosca que não agrega em nada a carreira profissional da pessoa entrevistada.
resposta | representatividade |
---|---|
menos de uma semana | 28.7% |
1 semana | 38.2% |
no máximo 2 semanas | 21.9% |
não vejo problema em demorar se eu estiver trabalhando | 2.7% |
não vejo problema em demorar, desde que responda | 8.2% |
não vejo problema em demorar, mesmo que nunca responda | 0% |
Você acha legal descrições de vagas que tem várias linguagens de programação, mas não diz exatamente com qual você vai trabalhar no dia-a-dia?
Essa é uma questão constante e que afasta a maioria das pessoas mais iniciantes ou pessoas que acabaram de se tornar mid level (pleno) e até mesmo pessoas em níveis mais altos que não querem ficar questionando a empresa, mas saber logo o que a empresa deseja dela.
90.4% das pessoas não acham legal uma descrição de vagas com muitas linguagens e somente 9.6% gostam ou não ligam para isso.
O que queremos na descrição da vaga é saber com qual tecnologia vamos trabalhar, não encontrar uma lista com: C, C++, C#, Java, JavaScript, Go, Python, Scala, Kotlin, Haskell, PHP, Erlang, Ruby, Elixir, Assembly, etc, etc, etc.
Uma lista dessas é extremamente confusa.
Nós estudamos uma lista pequena de linguagens ou até mesmo uma única para trabalhar com ela e, por mais que não ligamos sobre com qual tecnologia vamos trabalhar no dia-a-dia, pois depende do projeto, quando vemos uma lista dessas acabamos achando que não somos capazes de passar no processo seletivo da empresa.
Se você, pessoa recrutadora, deseja que a pessoa entrevistada saiba algo que essas linguagens trazem, como orientação a objetos em Java, gerenciamento de memória em C, alta performance em sistemas distribuídos com Golang, escalabilidade com Erlang, manutenibilidade com C#, maleabilidade com PHP ou JavaScript ou qualquer outra característica que são aprendidas com essas tecnologias, coloque logo na descrição o que você quer que a pessoa saiba e não as linguagens de nicho.
Você gostaria de saber, na descrição da vaga, qual framework ou lib vai utilizar no trabalho?
Esta também é uma questão muito previsível. Às pessoas investem seu tempo para aprender uma tecnologia e, por consequência, querem trabalhar com isso.
93.8% gostariam de saber qual framework ou lib vai utilizar no trabalho já na descrição da vaga e somente 6.2% não ligam.
Lembrando que as pessoas não querem ficar presas nas tecnologias, meu querido CTO, gestor, líder ou pessoa recrutadora, elas sabem que devem ser maleáveis em sua profissão e que as tecnologias morrem, mas elas não querem aprender algo em uma semana só para passar no seu teste.
Você acha importante saber, já na entrevista, como é a cultura da empresa?
A maioria esmagadora gostaria de saber sobre a cultura da empresa logo na entrevista, afinal é algo decisivo para aceitar uma proposta ou não.
98.3% das pessoas gostariam de saber sobre a cultura já na entrevista e somente 1.7% não ligam.
Quais pessoas você gostaria de conhecer na entrevista?
Quando chegamos na entrevista, esperamos ser recebidos (as) por algumas pessoas, essas pessoas são:
resposta | representatividade |
---|---|
liderança técnica | 586 respostas |
um programador | 504 respostas |
uma programadora | 478 respostas |
a gestão | 405 respostas |
CTO | 231 respostas |
uma pessoa trans | 163 respostas |
um (a) profissional PCD | 159 respostas |
Você gostaria de saber o salário antes de começar o processo seletivo?
Em vagas para o exterior é comum sabermos o salário já na proposta, antes mesmo de começar o processo seletivo.
Isso é extremamente efetivo, afinal se o salário for um parâmetro decisivo para a pessoa, não agradar e não for negociável ninguém perde tempo seguindo com o processo seletivo.
resposta | representatividade |
---|---|
sim | 84.2% |
prefiro negociar no fim | 13.5% |
não ou não ligo | 2.3% |
Você gostaria de saber exatamente qual a sua futura função na empresa (como time e escopo) antes de começar o processo seletivo?
Essa resposta também era previsível, uma vez que nossa experiência em entrevistas é um tiro no escuro. Não sabemos em qual produto vamos trabalhar, como vamos trabalhar e nem com quem.
Isso é efetivo para a empresa, afinal ela pode renegociar a posição da pessoa depois do processo seletivo entre gestores (as), porém a pessoa entrevistada fica bem perdida sem ter essa informação ou pelo menos um resquício dessa informação.
89.1% das pessoas gostariam de saber exatamente sua função antes do processo seletivo e 10.9 não liga.
Conclusão
Essa pesquisa foi bem longa e difícil de compilar. Espero que lhe sirva de apoio para melhorar seu processo seletivo e, se você for dev, para te fazer ser ouvido (a) pelas empresas.
Lembrando que não existe regra perfeita para todas as pessoas. Nós, como pessoas recrutadoras (empresa, liderança, participantes do processo seletivo) precisamos adaptar, sim, o processo para cada pessoa, afinal somos todos seres únicos e só vamos saber realmente o potencial das pessoas se fizermos as perguntas certas para a pessoa certa.
Se você gostou dessa pesquisa, compartilhe com sua liderança, gestão, diretoria, com outras pessoas desenvolvedoras ou com quem você achar que precisa conferir esses dados. :heart: